sábado, outubro 29, 2005

Cernuda


Que ruído tão triste

Que ruído tão triste fazem dois corpos quando se amam,

parece o vento que se move no outono

sobre adolescentes mutilados,
enquanto as mãos chovem,
mãos ligeiras, mãos egoístas, mãos obscenas,
cataratas de mãos que foram um dia

flores no jardim de uma algibeira tão pequena.

As flores são areia e as crianças são folhas,
e o seu leve ruído é amável ao ouvido
quando riem, quando amam, quando beijam,

quando beijam o fundo
de um homem jovem e cansado

porque dantes sonhou de dia e de noite.


Mas as crianças não sabem,
nem tão-pouco as mãos chovem como dizem;

assim o homem, cansado de estar sozinho com seus sonhos,
invoca as algibeiras que abandonam areia,
areia das flores,
para que um dia decorem a sua face de morto.

(Los placeres prohibidos)

Luis Cernuda, 20 Poetas Espanhóis do Século XX, Alma Azul, 2003, (tradução de Ruy Ventura), p. 95.

1 comentário:

Cavalo Marinho disse...
Este comentário foi removido por um gestor do blogue.