
Em 1958, EI Monte era o grande chamariz do vale. Os primeiros colonos chamaram-lhe «o Fim da Rota de Santa Fé». Era uma cidade mexida e um bom sítio de diversões. Os colonos recentes chamavam-lhe «a Cidade das Divorciadas». Um sítio pitoresco, uma cidade de província típica do Oeste.
A população era de cerca de 10 000 habitantes, 90 % brancos e 10 % mexicanos. A cidade tinha cinco milhas quadradas e fazia fronteira com os baldios do condado.
A população aumentava nas noites de sábado. Gente de fora acorria a espreitar os bares de Valley e Garvey. O clube do EI Monte Legion apresentava o Cliffie Stone e bandas de província transmitidos ao vivo num canal de TV.
A assistência vestia-se à cowboy: homens de calças justas e chapéus de feltro de abas largas, mulheres de saias armadas e engomadas. O clube organizava bailaricos nos sábados em que o Cliffie fazia folga. Pachucos e punks brancos esmurravam-se regularmente no parque de estacionamento.
A auto-estrada de San Berdoo passava por EI Monte. Os motoristas desviavam para a Valley Boulevard em direcção a leste. Paravam para comer no Stan's Drive-In e no Hula-Hut. Paravam para beber no Desert Inn, no Playroom e no Horseshoe. Valley era o sítio de paragem obrigatório de sábado à noite. Os motoristas que seguiam para leste acabavam por se demorar por lá, quer tencionassem, quer não.
A acção terminava em Five Points - o cruzamento entre Valley e Garvey. O Stan's e o Playroom usufruíam de uma localização privilegiada na esquina nordeste. O Crawford's Giant Country Market ficava do outro lado da rua. Uma dúzia de restaurantes e tabernas aglomeravam-se junto do cruzamento.
A zona residencial de EI Monte ficava a norte, a sul e a oeste. As casas eram pequenas e dividiam-se em duas modalidades: imitação de rancho e cubo caiado de branco. Os mexicanos estavam isolados numa zona chamada Medina Court e num bairro de lata chamado Hicks Camp.
Medina Court estendia-se por três quarteirões de casas feitas de cimento e bocados de madeira recolhidos no lixo. Hicks Camp ficava logo do outro lado dos carris da Pacific-Electric e apresentava casas com chãos de terra e madeira arrancada a vagões antigos.
O filme Carmen Jones foi rodado em Hicks Camp em 1954. Uma favela mexicana passou por uma favela de negros das plantações. Os cenógrafos não tiveram de alterar um único pormenor.
Os bêbedos e drogados pululavam em Medina Court e Hicks Camp. Um modo de homicídio predilecto em Hicks Camp era embebedar a vítima e deitá-la sobre os carris para que um comboio de mercadorias a decapitasse.
O Departamento da Polícia de EI Monte comandava os carros-patrulha e investigava todos os crimes que não envolvessem homicídios. A lista do pessoal era de vinte e seis polícias, uma guarda prisional e um controlador de parquímetros. O Departamento tinha uma reputação relativamente limpa. Os comerciantes locais abonavam os rapazes de produtos alimentares e licor. Os polícias de EI Monte iam sempre às compras de uniforme.
Os homens faziam as rondas sozinhos no carro. O ambiente de trabalho era amistoso - capitães e tenentes bebiam com simples bestas matarroanas. A Polícia era uma profissão de alternativas podia-se ajudar as pessoas, ou espancar os imigrantes mexicanos ilegais, ou engatar as meninas, de acordo com as tendências de cada qual.
Os rapazes usavam uniformes de caqui e conduziam viaturas de serviço Ford de 1956. Apreendiam carros, que negociavam com os representantes locais, e armavam zaragata com os Serviços do Xerife por dá cá aquela palha. Metade dos homens alistava-se num sistema de clientelismo. Metade entrava pelo serviço civil.
O Departamento da Polícia entregava os seus crimes de morte à Divisão de Homicídios do Xerife. Para uma cidade violenta e agitada, tinham tido muito poucos homicídios.
Duas mulheres com aspecto de fufas mataram um pintor de casas de El Monte a 30 de Março de 1953. O homem chamava-se Lincoln F. Eddy.
Eddy e Dorothea Johnson tinham estado todo o dia a beber em vários bares de El Monte. Passaram por casa de Eddy ao fim da tarde. Eddy obrigou Miss Johnson a fazer-lhe um broche. Miss Johnson foi para casa e discutiu o assunto com a sua roommate, Miss Viola Gale. As mulheres pegaram numa espingarda e dirigiram-se para casa de Eddy.
Mataram Lincoln Eddy. Dois rapazes que brincavam à apanhada na rua viram-nas entrar e sair. Foram presas na manhã seguinte. Foram julgadas e condenadas a longas penas de prisão.
No dia 17 de Março de 1956, Mr. Walter H. Depew entrou com o carro na parede da frente do Ray's Inn na Valley Boulevard.
Dois homens foram atropelados e mortos. A dianteira do carro arrancou um pedaço de 5,5 m da parede da frente e um pedaço de 6 m da parede de trás. Vários outros clientes do bar ficaram feridos.
Mr. Depew tinha estado a beber no Ray's Inn, onde a sua mulher era empregada de balcão. Mr. Depew discutira com o proprietário, que o expulsara algumas horas antes do incidente.
Mr. Depew foi preso imediatamente. Foi julgado e condenado a uma curta pena de prisão.
A Divisão de Homicídios do Xerife tomou conta de ambas as ocorrências. Os seus últimos três homicídios de EI Monte tinham sido resolvidos em tempo record.
O caso Jean Ellroy já se arrastava há mais tempo.
James Ellroy, O Meu Quarto Escuro, Editorial Notícias (tradução de Margarida Vale de Gato), p. 30